Dia
Internacional da Mulher
No dia 8 de março comemora-se o Dia das Nações Unidas para os Direitos das Mulheres e para a Paz Internacional.
Calçada de Carriche
São Sousa
No dia 8 de março comemora-se o Dia das Nações Unidas para os Direitos das Mulheres e para a Paz Internacional.
A
todas as mulheres, neste dia tão especial, dedico o poema "Calçada de
Carriche" de António Gedeão.
Luísa sobe,
sobe a calçada, sobe e não pode que vai cansada. Sobe, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe sobe a calçada. Saiu de casa de madrugada; regressa a casa é já noite fechada. Na mão grosseira, de pele queimada, leva a lancheira desengonçada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada. Luísa é nova, desenxovalhada, tem perna gorda, bem torneada. Ferve-lhe o sangue de afogueada; saltam-lhe os peitos na caminhada. Anda, Luísa. Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada. Passam magalas, rapaziada, palpam-lhe as coxas, não dá por nada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada. Chegou a casa não disse nada. Pegou na filha, deu-lhe a mamada; bebeu da sopa numa golada; lavou a loiça, varreu a escada; deu jeito à casa desarranjada; coseu a roupa já remendada; despiu-se à pressa, desinteressada; caiu na cama de uma assentada; chegou o homem, viu-a deitada; serviu-se dela, não deu por nada. |
Anda, Luísa.
Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada.
Na manhã débil,
sem alvorada, salta da cama, desembestada; puxa da filha, dá-lhe a mamada; veste-se à pressa, desengonçada; anda, ciranda, desaustinada; range o soalho a cada passada; salta para a rua, corre açodada, galga o passeio, desce a calçada, desce a calçada, chega à oficina à hora marcada, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga; toca a sineta na hora aprazada, corre à cantina, volta à toada, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa, larga que larga. Regressa a casa é já noite fechada. Luísa arqueja pela calçada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada, sobe que sobe, sobe a calçada, sobe que sobe, sobe a calçada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada. |
António Gedeão, in “Teatro do
Mundo”
Poeta/Professor/Pedagogo/Investigador
(1906 – 1997)
Felizmente,
o tempo e a persistência de grandes mulheres trouxeram a Mudança.
Gradualmente,
as mulheres conseguiram libertar-se das amarras que impediam a sua afirmação
social e garantir o respeito pelos seus direitos enquanto seres humanos.
Contudo,
é bom não esquecermos nunca que, apesar destas conquistas, em pleno séc. XXI,
em vários cantos do mundo e até mesmo ao nosso lado, mulheres como esta
"Luísa" continuam a ser uma Realidade Cruel, Desumana e (perdoem-me a
redundância) Real...
É
sobretudo às muitas "Luísas" anónimas do nosso país e do mundo que
dedico este poema. Tratam-se de "grandes" mulheres com coragem para
despertarem todos os dias para a mesma realidade ingrata. Esta “fraqueza” não
impede que elas sejam umas “heroínas”, pois vivem o dia a dia a um ritmo
alucinante e stressante; acordam e adormecem a pensar no bem estar dos que as
rodeiam, esquecendo-se delas próprias e esquecendo-se do que é ser amada e
acarinhada…
Estas
mulheres precisam que a sociedade, as instituições que existem para as
proteger, os nossos políticos, os seus amigos, os seus familiares, os seus
filhos lhes digam que elas são “Grandes”, mas que podem ser
"Grandiosas" se compreenderem que são seres humanos, que têm o
direito à sua liberdade, à sua dignidade, a serem respeitadas, a serem Felizes,
a serem Mulheres...
A
todas, mas sobretudo a estas Mulheres: Um Feliz Dia!
São Sousa
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